quarta-feira, 22 de julho de 2020

Pensando & Conhecendo VII


Filósofos costumam escrever, escrever... Husserl aprendeu estenografia só para registrar mais rápido seus pensamentos.   Entre filósofos mais conhecidos, sempre há textos menos comentados, estudados do que outros que são considerados marcos para o pensamento de uma época.  Mas, às vezes, estes textos meio que deixados de lado contém registros muito importantes sobre seu pensamento.  Nem sempre é um detalhe que só desperte interesse na exumação acadêmica de um personagem histórico.   Às vezes, estes textos são desconcertantes.  Isso acontece com A religião nos limites da simples razão, de Kant. 

Com uma honestidade intelectual incomum, Kant confessa nesse livro que debalde seus monumentais esforços de pensamento, a crítica da razão prática não lhe parecia hábil em sondar o que possa ser chamado de mal radical.   Há muitas expressões e linguagens que insinuam essa incapacidade humana de se conciliar final e permanentemente com a sua natureza.  Pecado original, alma imoral, pulsão de morte, teatro da crueldade, a vida como ela é...

O que isso pode dizer sobre compliance?  A conduta de alguém nunca será tão reta quanto um raciocínio puder lhe propor como dever.  Como Kierkegaard soube descrever, só lhe restará o desespero.  Algo que foi comoventemente retratado pelo suicídio do Inspetor Javert em Os Miseráveis, de Victor Hugo.  Uma política de compliance que afinal proponha e exalte uma retidão de conduta como meta sua provavelmente irá esconder muito mais do que mostrar.  Vai propor um programa que já nasce destinado ao fracasso, simplesmente porque ofusca a humanidade com palavras esclarecidas.  Uma coisa é estabelecer protocolos de segurança para que se mantenham aviões no ar conforme o programado.  Outra coisa muito diferente são protocolos que mantenham uma ética no ar por uma questão de reputação.   Efetivamente, só sustentam moralismos. 

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