quarta-feira, 26 de abril de 2017

Igreja e escravidão: ambiguidade numa cidade que se partiu

Não diz tudo.  Mas diz sim alguma coisa.  Até hoje, o sino "Aragão" repousa no alto da velha Igreja de São Francisco de Paula.  Ele é o terceiro duma trinca que forma com o "Grande" e o "Vitória".

Hoje esquecidos dos cariocas, esses sinos já fizeram parte da crônica desta cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro.  Quando o Vitória troava, um incêndio se sabia por todos.  E, contando suas badaladas, os moradores se inteiravam aonde a cidade ardia.
Mas, no dia-a-dia, era o som do Aragão que ditava.  Ideia do Desembargador Teixeira de Aragão, que impôs um toque de recolher na capital do Império e o maior porto negreiro das Americas.  Literalmente.  Depois que o Aragão badalava à noite, qualquer um na rua podia ser abordado pelos milicianos.  Mas, aos negros, o Aragão presumia vadiagem: uma noite no calabouço, quase na certa. E  quiçá porrada, na entrada. Chibatada, na saída.

Ao saberem o que acontecia a escravos, quando começaram a ouvir o Aragão toda noite, as reclusas no convento das Carmelitas tomaram uma liberdade.  Um dos sinos da Igreja de Santa Teresa passou a repicar uns 20 minutos antes do Aragão.  Era para que ninguém fosse pego desprevenido, quando a milícia recebia licença para catar pretos pelas ruas da cidade. 


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