O
título é uma reminiscência do bordão humorístico televisivo na tradição do
Zorra Total. O bordão caiu no gosto popular por conta do sucesso alcançado nos anos 70 pela 1° trilogia Planeta dos Macacos.
Era mais uma
narrativa distópica pós apocalíptica atômica que foi comum nos telões daqueles
tempos. Estrelado significativamente pelo ator-ícone Charles Heston, a
trilogia convidava à catarse pela inversão do destino de um WASP
(branco, anglo-saxão e protestante) submetido à opressão extrema de uma
metáforica República de Bananas.
Esse sentido político de terceiro mundo foi enfatizado ainda mais no seriado subproduto para a TV, que introduziu o inesquecível Urko. Ele era um general gorila obsecado pelo estrangeiro, cuja presença convocava ao pensamento (este o argumento de tensão na trilogia cinematográfica exposto no antagonismo entre o personagem de Heston e Zaius, um macaco teocrata). Tanto Urko como Zaius intuíam uma subversão mais que possível e já insinuada no fascínio despertado num casal de jovens chipanzés intelectuais. Enfim, uma narrativa bem anos 70.
Esse sentido político de terceiro mundo foi enfatizado ainda mais no seriado subproduto para a TV, que introduziu o inesquecível Urko. Ele era um general gorila obsecado pelo estrangeiro, cuja presença convocava ao pensamento (este o argumento de tensão na trilogia cinematográfica exposto no antagonismo entre o personagem de Heston e Zaius, um macaco teocrata). Tanto Urko como Zaius intuíam uma subversão mais que possível e já insinuada no fascínio despertado num casal de jovens chipanzés intelectuais. Enfim, uma narrativa bem anos 70.
Já
entrou em cartaz o segundo filme da nova trilogia. O primeiro filme, A
Origem, reinventou o último da trilogia original. Embora ainda
focado na relação ciência e consciência, os argumentos são bem diferentes.
Em grande medida, A Origem é um drama psicológico na descoberta de si mesmo por um
macaco.
O roteiro do filme até que ia bem: “não confie em chimpanzés”. A fala da mocinha, uma zoóloga, indicava a questão fundamental que prometia ser explorada. Um chimpanzé transgênico apresentava uma inteligência que superava até mesmo a dos humanos. Inteligência aí revelada por tomada de decisões estratégicas, táticas e operacionais logicamente adequadas a cada situação que se lhe apresentavam. Mas, humanidade transcende a inteligência. Isso foi insinuado pela incapacidade desse chimpanzé em compreender interdições éticas. Isso aconteceu ao lidar com um vizinho brigão: foi incapaz de compreender porque fora expulso do paraíso. Ao não conter seu próprio impulso violento, morder o vizinho e ser por isso retirado de seu habitat.
O roteiro do filme até que ia bem: “não confie em chimpanzés”. A fala da mocinha, uma zoóloga, indicava a questão fundamental que prometia ser explorada. Um chimpanzé transgênico apresentava uma inteligência que superava até mesmo a dos humanos. Inteligência aí revelada por tomada de decisões estratégicas, táticas e operacionais logicamente adequadas a cada situação que se lhe apresentavam. Mas, humanidade transcende a inteligência. Isso foi insinuado pela incapacidade desse chimpanzé em compreender interdições éticas. Isso aconteceu ao lidar com um vizinho brigão: foi incapaz de compreender porque fora expulso do paraíso. Ao não conter seu próprio impulso violento, morder o vizinho e ser por isso retirado de seu habitat.
Mas,
o enredo infelizmente seguiu pelo terreno pantanoso do politicamente correto.
O foco passou a ser a ganância da indústria farmacêutica e a
crueldade com os animais. Aí, o roteiro comete uma idiotice. Numa
contradição evidente com seu argumento inicial, o tal macaco consegue
estabelecer relações éticas com outros macacos do abrigo para animais em
que é posto. É como se, de repente, a ética passasse a ser uma manifestação
natural acessada e dominada pelo intelecto, tal como é a lei da
gravidade. O filme se torna um pastiche, uma comédia involuntária.
Os macacos se descobrem encarcerados e oprimidos. E estabelecem “naturalmente”
um código moral típico entre presidiários. E o chimpanzé que ficou inteligente
com o tal vírus furta e espalha mais dele. É uma paródia de preso político que
conscientiza com ideologia censurada outros presos, antes “comuns”. A
consciência coletiva evolui na organização do PCC: Primatas no Comando da
Capital. Subversão como patologia é isso aí.
Então, acontece a batalha. A figuração é: macacos oprimidos contra as forças repressoras a serviço do cartel da indústria farmacêutica. A batalha é o salve geral. A dublagem perdeu uma oportunidade de ouro na cena final. Após a batalha, o mocinho, o cientista fofo, que, no início do filme, cuidava carinhosamente do macaquinho danado, o convida para voltar para casa. Porém, o chimpanzé da pá virada dá uma olhada para o bando de símios marginalizados que o acompanham na “liberdade” da sua “Sierra Maestra” e finalmente articula o texto de ser "quem" se sabe macaco: “Já estou em casa.” Melhor acabamento o filme teria se o texto falado pela dublagem fosse outro: “É nóis, tá ligado?”
O filme volta à
fábula explorada pela primeira trilogia, com direito ao contexto pós
apocalíptico. A causa do apocalipse não é mais atômica, mas biomédica, recurso comum nos filmes de
zumbis. Aliás, este filme guarda ainda uma afinidade com bons filmes de zumbis pela abordagem mais antropológica. E como na inaugural Noite dos Mortos Vivos, o argumento formula uma questão racial. O corpo é apresentado
como que numa casa de espelhos em que as identidades vão sendo criadas e
recriadas historicamente pelos incontáveis reflexos da alteridade diante de
si. A descoberta dos preconceitos se dá entre a criação e a recriação
dessas identidades.
A esperteza do roteiro para apresentar o argumento aparece num deslocamento do antagonismo entre macacos e humanos para o interior da comunidade símia, que culmina numa disputa política pelo poder. Bem ao estilo da fábula de George Orwell proposta na Revolução dos Bichos. Como na fazenda orwelliana, a condição humana é desvelada no abismo entre o que identifica e o quem é identificado. O quem só se mostra nas infinitas possibilidades entre o que é feito com alguém e o que este alguém faz com o que é feito dele. Deste modo, o confronto se que dá título ao filme está revelado na radicação da violência pessoal. Ela se articula a partir do interior da comunidade de primatas para um conflito generalizado de todos contra todos, simbolizado então nas batalhas entre homens e macacos.
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